sábado, 25 de dezembro de 2010

Deleuzianamente


vida severina
espasmos de cor
ação em terra
seca colhe a chuva
o corpo per
severa via
viso visgo de raiz
rizoma de riscos

sábado, 4 de dezembro de 2010

hieróglifo


grafo minhas crises
gravo na memória o crime
grave de per correr a pedra

sábado, 27 de novembro de 2010

Os livros (ou os fantasmas) de Borges


Os Meus Livros

Os meus livros (que não sabem que existo)
São uma parte de mim, como este rosto
De têmporas e olhos já cinzentos
Que em vão vou procurando nos espelhos
E percorro com a minha mão côncava.
Não sem alguma lógica amargura
Entendo que as palavras essenciais,
As que me exprimem, estarão nessas folhas
Que não sabem quem sou, não nas que escrevo.
Mais vale assim. As vozes desses mortos
Dir-me-ão para sempre.


Jorge Luis Borges

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

fall'ácias


filosofias de botequim
em mesa de cupim
heideggerianos falares
e falácias
histórica mente
um borra Borges pensante
pensando ser gente grande
atirou a poesia pelo ralo
descobriu Bueiros Aires

sábado, 6 de novembro de 2010

Com vento


Ela ajeita as pétalas de primavera no vaso. O canto da sala se mostra indiferente. Lá fora, o canto do vento provoca o silêncio que ecoa na casa.
De súbito a porta se abre. Ele não pede licença. Agora tudo é movimento. Os girassois de Van Gogh se espalham por toda a sala. Sobre o piso, os cacos da moldura se moldam aos caos. E ela... ela sente a vida. Ele forma ondas no sangue, como no mar. Na lembrança o velho vinil: nada do que foi será.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

circunstância


não sei como seria
se fosse sem você
mas sendo Eu Sou

sábado, 23 de outubro de 2010

Eus


Eu somos a soma dos sujeitos de mim.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Êxodo


Vento no roseiral
Pétalas fugitivas
Para onde foram todos os perfumes?

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

garatujas polissêmicas


nos RabISCOS
reBUSCO
os SENTIDOS

sábado, 25 de setembro de 2010

Le Petit Prince


Em seu pequeno mundo
Encontrará uma flor
Aprenderá a regá-la
E saberá deixá-la
Para conhecer outras flores
E mundos maiores

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

hidrófila


no deserto dos gestos
secos
arrulhos de flor em cor
ação vermelha seiva
nas veias de vidas
pulsam olvidos em
ecos

domingo, 12 de setembro de 2010

Maríntimo


Hoje eu acordei com vontade de rever o meu psicólogo. De tempos em tempos preciso da consulta. Arrumei o cabelo, passei batom, e fui! O coração tocava, descompassado, um samba de Lamartine, ansioso pelo encontro, quero dizer, pela consulta. Dentro do ônibus, o meu olhar perdido nas janelas viajou para um destino desconhecido. Olhei para mim, mas não me vi. Eu só me enxergo diante dele! Por isso, o procurei impacientemente. Eu precisava de mim!
De repente, o avistei! Azul! Hoje ele estava mais azul! Parecia ter concentrado toda a sua cor para mim. Desci do ônibus. Caminhei ao encontro dele, me joguei na areia e deixei a sua língua azul lamber os meus pés. Fiquei ali, parada, olhando para ele. Estátua de açúcar derretendo-se ao sal. Mordi nos lábios o gosto das lágrimas. Então me vi, refletida no espelho de soro.
Ao longe, o voo das garças rompeu o silêncio das ondas. O coração retomou o batuque torto, como os meus passos na areia.
Fim da consulta. Voltei para casa desarrumada e sem batom, mas com a alma alva e leve, como as asas das garças.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

lápis-lazúli


leve a lida
lave as luvas

da vida ficam as uvas
que o ivo viu

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Gênio


Preso à lamparina mara
habita a gruta grota grotesca
espreita a greta de onde
um tesouro sairá
sua herança...

Presa à liberdade
que me cabe nesse (desen)conto
canto a pedra que quebre
(e quebra?)
a lâmpada de brilho falso.

Mas, não medre o impacto.
Deixarei intacta
sua herança...

Sim! Amo!

domingo, 15 de agosto de 2010

licantropia em aquarela


em ato heroico brado retumbante
salve, salve, salvaste
a tua pele de mim
o que me resta dessa festa?
fragmentos de uma tela
(na memória)
pelo de lobo em um rosto
um esboço de ti.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

carta resposta


rasgue os papeis
recorte os medos

diante de segredos
não há o que dizer

estalos de dados e dedos
o jogo se refaz no tabuleiro

sexta-feira, 30 de julho de 2010

orvalho


com a lua nos olhos
e o sol nas mãos
vaga a menina vazia
é fácil iluminar o caminho
difícil esclarecer a caminhada
a menina se distrai
com o brilho das lágrimas
das flores

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Vertigem


Quando os passos já não alcançam o chão
O voo parece tangível

terça-feira, 13 de julho de 2010

in vento


sopram as palavras
invento letras ao vento
sonhos espalhados

domingo, 4 de julho de 2010

A cerca do Olimpo


o muro tingido de verde
hera
esconde o mundo fingido
da trepadeira que se quer flor
da flor que se sente
fera

segunda-feira, 28 de junho de 2010

unicor


o sol des
cansa a retina
desce
o horizonte
onde
o arco-íris só
tem uma cor:
a sua

terça-feira, 22 de junho de 2010

ovão e ovinho


entre o que foi
e o que poderia ter sido:
o vão e o vinho

domingo, 13 de junho de 2010

o outro lugar da pedra


a pedra do caminho
foi jogada no lago:
lago para todo lado!

sábado, 5 de junho de 2010

em se plantando...


semen te
em terra fértil
se mente
sente
fertilicidade

sexta-feira, 28 de maio de 2010

O luzeiro da noite


oposta ao cálido dia
indiferente ao meu olhar
distante e fria
reflete a luz
que não é sua
gorda e nua
a lua
lua o luar

sábado, 22 de maio de 2010

Ilha


Desejo a liberdade dos pássaros
Voar com as asas de Ícaro
Em dia nublado
Romper a redoma de (a)mar.

sábado, 15 de maio de 2010

O Circo


A vida segue seu curso, como o rio que nunca é o mesmo rio. Rio da vida. Circo sem lona! Neste circo sou palhaço, ilusionista, sou a ilusão, sou artista. Entre malabarismos e contorcionismos, muitos coelhos saem da cartola. Os ismos provocam os sismos, e então eu cismo, bambo, na corda. Mas, quando a queda é inevitável, da rede não passo. Sofro com o impacto. Porém, este me impulsiona de volta ao topo. Agarro firme o fio e reaprendo o equilíbrio. De cima, vejo os olhares perplexos e os aplausos inacreditados. Às vaias não dou ouvidos. Meu salário é o sorriso das crianças. O espetáculo nunca é o mesmo espetáculo, como o rio que nunca é o mesmo. Rio da vida!

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Coralavras


Meu coração está em palavras!

sábado, 1 de maio de 2010

Outono


Sobras do verão:
Folhas e olhares secos
Perdidos no chão.

domingo, 25 de abril de 2010

Liscactor


Floresce a coragem
no deserto. Está perto
do coração selvagem

quarta-feira, 21 de abril de 2010

A víbora


escar late
o veneno
verdoso
é o antídoto

sábado, 17 de abril de 2010

Tempo


O melhor remédio
Um senhor de barbas brancas
Leva a dor e o tédio

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Monólogo


- Eu sei que você não é feliz. De alguma forma, sinto. Te conheço mais do que imagina. Não pela convivência, pois não temos. Eu leio você, o meu livro predileto. Talvez, comigo sentiria menos peso. Sim, peso. Ela pesa a sua vida, e eu, eu sou leve. Ela pesa, mas você gosta. Não! Acho que não gosta. No entanto, não quer se livrar. É um paradoxo? Um feitiço, talvez! É isso, ela é uma bruxa, fada, maga... Eu não sei a receita, não sei ser bruxa, nem fada, nem anjo, nem demônio. Só sei ser eu e os muitos eus, que não necessariamente disfarces, apenas defesas. Ela sim, consegue ser o que quer, para te encantar. O pior é que você conhece todas as suas máscaras e ainda aplaude, na primeira fila, o espetáculo. E sofre. E gosta de sofrer. Será mesmo que você gosta dela? Ou das personagens? Quanto a mim, o feitiço te cega. Até tentei ser sua guia, mas você preferiu caminhar com as pernas dela. Tentei me aproximar, você me rechaçou. Nem amizade! Ela não deixa e você não quer. Oh, você não quer! Talvez por medo! Descobri que sou mais forte do que vocês dois. Sim, sou leve e forte! Serei uma ameaça? Ameaça a quê? Bem, isso só você pode dizer. Mas não diz. Não age, nem reage. E então ficamos assim, sem verbo entre nós. Sem ação, não há como desatar os nós entre nós. Nós? Alguma vez houve nós? Creio que não! Nos raros e rasos contatos houve você. Eu só ouvia. Eu apreendi você em cada palavra, em cada gesto. Entretanto, você fez pouco caso do meu silêncio, não quis ouvi-lo. Não me mostrei porque você não deu chance. Jamais dimensionou a perda. Não sabe o que perdeu. O erro foi meu. Ouvir e não falar. Finalmente, agora falo. Está ouvindo? Penso que não. Está longe. A bruxa te levou definitivamente. Mas, há algo definitivo na vida, a não ser a morte?
Você foi o sonho que a distância impediu de se tornar pesadelo, até então,

domingo, 28 de março de 2010

si sifu


carregar a pedra
morro
a cimo
de tudo
in sis(mo)
tente

domingo, 21 de março de 2010

Azul + Amarelo = Verde...


sou a areia fina
que o sol clareia na praia
onde o rio azul não joga suas águas
e a tarde quente insiste
em tingir de amarelo o meu só -
riso frio e lírico
rio de lagrimazul.
E você?

domingo, 14 de março de 2010

Fraco (trecho)


...Uma PeDra de açúcar em muitas LáGRImas
te gosto muito MESMO...
Uma Praga Doce Feita Com o Vinagre
O G-E-S-T-O CORTANTE e o N-A-D-A


Sérgio Blank

domingo, 7 de março de 2010

Espelho


pedra dura em água mole
dança a lua
nas ondas do lago

sábado, 27 de fevereiro de 2010

sau...


s
a
u
doi
a
d+
e

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

meu Dédalo


você me deu asas
de cera
e um sol
para derretê-las

domingo, 7 de fevereiro de 2010

enigma


mon alisa
mon amour

domingo, 31 de janeiro de 2010

José Paulo Paes


Poeta, tradutor, ensaísta. Bebeu da fonte de Modernistas e Concretistas.
Seus poemas se destacam pela ironia que leva à reflexão.
Foi excelente tradutor de poetas latinos e de poesia erótica.
Eclético, escreveu para crianças.

Segue abaixo, uma seleção de metapoemas, uma singela homenagem a este artista, relativamente pouco conhecido:

O ALUNO

São meus todos os versos já cantados;
A flor, a rua, as músicas da infância,
O líquido momento e os azulados
Horizontes perdidos na distância.

Intacto me revejo nos mil lados
De um só poema. Nas lâminas da estância,
Circulam as memórias e a substância
De palavras, de gestos isolados.

São meus também, os líricos sapatos
De Rimbaud, e no fundo dos meus atos
Canta a doçura triste de Bandeira.

Drummond me empresta sempre o seu bigode,
Com Neruda, meu pobre verso explode
E as borboletas dançam na algibeira.


TERMO DE RESPONSABILIDADE

mais nada
a dizer: só o vício
de roer os ossos
do ofício

já nenhum estandarte
à mão
enfim a tripa feita
coração

silêncio
por dentro sol de graça
o resto literatura
às traças!


ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA

a poesia está morta

mas juro que não fui eu

eu até que tentei fazer o melhor para salvá-la

imitei diligentemente augusto dos anjos paulo torres carlos drummond de andrade manuel bandeira murilo mendes vladimir maiakóviski joão cabral de melo neto paul éluard oswald de andrade guillaume apollinaire sosígenes costa bertolt brecht augusto de campos

não adiantou nada

em desespero de causa cheguei a imitar um certo (ou incerto) josé paulo paes poeta de ribeirãozinho estrada de ferro araraquarense

porém ribeirãozinho mudou de nome a estrada de ferro araraquarense foi extinta e josé paulo paes parece nunca ter existido

nem eu


POÉTICA

conciso? com siso

prolixo? pro lixo


SEU METALÉXICO

economiopia
desenvolvimentir
utopiada
consumidoidos
patriotários
suicidadãos

domingo, 24 de janeiro de 2010

amanheceu...


e o sol
curioso
debruçou-se na
janela para ver
um pouco de mim
e o resto de você

sábado, 16 de janeiro de 2010

Volta ao mundo em 80 segundos


"João amava Tereza que..." Não, Drummond! Ninguém amava Tereza.
Ela sempre caía e se levantava sozinha; não havia quem lhe desse a mão. O primeiro ela não conheceu; o segundo, não sabia se existia; o terceiro, tinha certeza que não. Terezinha não era de Jesus, não foi para o convento. Abandonada pela mãe, foi para a casa da tia velha e doente. Estudou pouco e trabalhou muito. Logo a tia morreu. Melhor assim! Melhor ficar só com o computador do que com uma velha coroca. Tereza compartilhava a sua solidão com pessoas de todo o mundo, através dos satélites.
A solidão tem muitos disfarces, e Terezinha de Ninguém conheceu todos.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Receita de Ano Novo


Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir ou receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer listas de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.


Carlos Drummond de Andrade