sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Reminiscências


Na estação da pequena cidade, eu esperava o trem que trazia a minha nova vida. Estava feliz, pois ao meu lado estava o recente marido, e, à frente, a quilômetros dali, a minha casa na cidade grande e as responsabilidades de esposa e mãe. Eu desejava as novas experiências. Finalmente, o trem chegou, o enorme bicho de ferro e aço! Ao botar os pés no vagão, pisei no futuro. O passo foi forçadamente firme, mas as pernas tremiam. Deixei para trás a cidadezinha, a família e os amigos! Acostumar-me com a cidade grande não foi fácil, mas o tempo é o melhor professor, ele nos ensina a viver de acordo com as diferentes circunstâncias. Com o nascimento de cada um dos cinco filhos, a maturidade se fortalecia e eu aprendia a lidar com os defeitos do marido, e com os meus.
Ao entrar naquele trem, eu não sabia que o futuro seria como ele: de ferro e veloz. Hoje, entro neste quarto e vejo na foto um rosto adolescente e feliz.
Eu, que jamais senti saudade da pequena cidade, embarco de volta no trem. Na chegada, o brilho do sol refletido nas ruas de pedra sabão ofuscam os meus olhos. Posso ouvir a sinfonia que resulta do atrito dos cascos dos cavalos e das rodas das charretes contra as lisas e brilhantes pedras. Sinto o cheiro de estrume. Ah! Eu gostava do perfume de cavalo que se espalhava por toda a cidade. Ainda vejo nas calçadas as árvores redondas, cuidadosamente podadas. No jardim da praça da Matriz, as azaleias dão o tom púrpuro às matinais missas de domingo. Mamãe me obrigava a ir às missas. Tão logo o padre dizia o amém, eu corria para o jardim, na ânsia de pular amarelinha com as amigas. Esse era o lado bom das manhãs de domingo.
As lembranças colocam os meus pés naquele chão novamente. Caminho em direção à ilha que eu chamava de minha. Na ponte, a boiada estourada corre ao meu encontro, o que me obriga a procurar os vãos de concreto, e, ali fico até a boiada passar, tendo a ponte sobre as mãos e as águas barrentas do rio sob os pés. Quantas vezes isso aconteceu, meu Deus? Não sei! O que só agora percebo é que eu gostava disso, me divertia. Foram tantas aventuras! Eu andava a passos de tartaruga, parava no meio da ponte com a desculpa de admirar a paisagem tão familiar. Na verdade, eu queria os bois, os desafios que eles me lançavam, os quais eu sempre vencia me jogando sob o concreto. A sensação de ter os ruminantes sobre mim sem me causar dano me dava alegria, puro êxtase de vencedora. Além dos bois e do rio, a ponte me traz outras doces recordações: os namoricos adolescentes. Meus pais nunca souberam que eu matava aula para namorar ao som das correntezas.
Eu, que jamais senti saudade da pequena cidade, me surpreendo, neste momento, segurando esta fotografia com as mãos flácidas e trêmulas. No papel amarelado meu rosto jovem e alegre ficou eternizado. No papel móvel do tempo, o futuro deixou a ferro suas marcas.
Quase um século de vida! Pouso a foto na gaveta do armário, fecho a porta do quarto na casa que o eufemismo denomina Clínica de Repouso, viro a página, e entro agora no último capítulo de minha história, que comecei a escrever com a linha do trem.

sábado, 17 de outubro de 2009

Paradox


So soul
So flesh
It is a fight!

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Primavera


É tempo de florir
Então vamos abrir
As Pétalas!

sábado, 3 de outubro de 2009

O Silêncio


O que Mario Quintana e Arnaldo Antunes têm em comum?
- O silêncio.

"Convivência entre o poeta e o leitor, só no silêncio da leitura a sós. A sós, os dois. Isto é, livro e leitor. Este não quer saber de terceiros, não quer que interpretem, que cantem, que dancem um poema. O verdadeiro amador de poemas ama em silêncio..."

"...vamos ouvir esse silêncio meu amor
amplificado no amplificador
do estetoscópio do doutor
no lado esquerdo do peito, esse tambor."